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Autoria
Chris Mayer
Chris Mayer

Artigo publicado originalmente no blog da Woodlock House Family Capital

Extinção e Sobrevivência

"A extinção é a regra. A sobrevivência é a exceção"
Carl Sagan

Tem-se falado muito da forma como a pandemia acelerou muitas tendências já existentes. O movimento para o comércio digital, por exemplo, em detrimento do retalho físico. Ou a tendência de cada vez mais pessoas trabalharem em casa em vez de o fazerem no escritório.

Mas a pandemia criou também um ambiente completamente novo para muitas empresas, como restaurantes. Os velhos modelos económicos poderão não conseguir sobreviver a esta adaptação. Por exemplo, os modelos que dependem de os clientes se aglomerarem dentro do restaurante, ao contrário daqueles que se conseguem adaptar para a entrega ao domicílio ou take away.

Tenho refletido em como esta súbita mudança no ambiente de negócios é, de certa forma, semelhante a eventos de extinção na biologia.

As economias também sofrem grandes eventos de extinção. Se tivéssemos investido numa empresa cotada no mercado de ações da China em 1949, teríamos sido dizimados quando os comunistas assumiram o poder. O mesmo ocorreu na Rússia em 1917. Outros mercados chegaram a zero, ou quase zero, devido a algum grande terremoto político ou económico. Muitas empresas morrem de uma só vez (ou num curto período de tempo), exatamente como num evento de extinção biológica.

Claro que também existem eventos de extinção menores. Bolhas que “rebentam” e deixam um rasto de falências. Ou quando os governos mudam as regras do jogo de forma severa e repentina, de modo que as empresas ou se ajustam ou simplesmente fecham as portas.

Uma das minhas histórias favoritas é a forma como a Anheuser-Busch sobreviveu à Lei Seca. Murray Stahl conta-nos essa história no seu livro, How They Did It: Exceptional Stories of Great Investors. Alguma vez se perguntou como é que a Anheuser-Busch sobreviveu à Lei Seca? O governo ilegalizou a venda de cerveja. Isto parece ser um enorme problema para uma cervejeira.

Mas ela sobreviveu. Primeiro, tentou fabricar produtos diferentes. Gelados, por exemplo. E cerveja sem álcool. A empresa chegou a prometer devolver o preço da cerveja caso os compradores conseguissem sentir a diferença. A maioria das pessoas não conseguia. Mas, ainda assim, não compravam a cerveja sem álcool. Só isto já quer dizer qualquer coisa.

De qualquer forma, nada disto resultou. Mas a administração da empresa acabou por descobrir uma solução que salvou a empresa. Eles detetaram uma lacuna na lei. É ilegal fabricar, vender ou transportar bebidas alcoólicas. OK. Mas a Lei Seca não proibia a fabricação, venda e transporte de extrato de malte não fermentado ... que os clientes podiam levar para casa e utilizar para fabricar sua própria cerveja, adicionando água e deixando que fermentasse. Foi isto que a Anheuser-Busch fez; começou a vender extrato de malte.

Rapidamente, vendiam 6 milhões de libras de extrato de malte por ano, o que produz uma enorme quantidade de cerveja. August Busch disse: “Acabamos por nos tornar o maior contrabandista dos Estados Unidos”.

Murray Stahl, refletindo sobre este pedacinho da história, escreveu como isto “humilha” o “short-seller” (vendedor a descoberto), porque mostra como “as empresas, se estiverem bem capitalizadas, podem ser muito resilientes”.

Estar bem capitalizado, porém, pode não chegar. Na verdade, se recuarmos e estudarmos para a história dos mercados, poderemos ficar surpresos ao descobrir que a expectativa de vida de uma empresa está a diminuir - bastante. “Um estudo recente da McKinsey conclui que a média de vida das empresas cotadas no Standard & Poor’s 500 era de 61 anos em 1958”, escreve Stéphane Garelli, professor emérito do IMD. “Hoje, são menos de 18 anos.”

Isto aplica-se ao conjunto das maiores e (frequentemente) mais bem capitalizadas empresas do mercado. Como Sagan diz acima, “A extinção é a regra. A sobrevivência é a exceção.” Imagino que a taxa de atrito seja muito mais elevada, digamos, no Russell 2000 - composto por empresas mais pequenas. Ou ainda pior entre empresas privadas, muitas delas empresas familiares sem acesso fácil a capital.

Mas há sempre sobreviventes, mesmo nos piores eventos. Um artigo publicado na Aeon por Renée Duckworth, uma professora associada da Universidade do Arizona é muito relevante para esta discussão. Ela escreve sobre a extinção em massa mais famosa da Terra. Mais de metade de toda a vida pereceu quando um asteróide atingiu a península de Yucatán. No entanto, um pouco menos de metade dos seres vivos sobreviveu. A catástrofe impulsionou a mudança evolutiva. “A sobrevivência exigiu engenho e flexibilidade”, escreve Duckworth.

Eu acredito que o mesmo se aplica às empresas. Se a Amazon nunca tivesse expandido para além da venda de livros, provavelmente não teria sobrevivido como empresa independente. Se a Apple não inventasse iPods e iPhones, etc., provavelmente não teria sobrevivido. Sobreviver é mais do que apenas estar bem capitalizado. Precisamos dessa flexibilidade e engenho.

Também precisamos de um pouco de sorte. Sejamos francos. A força do balanço ou a competência da administração não importaram para nada na China em 1949. A empresa estava condenada.

Tenho refletido nestas questões enquanto analiso o meu portfólio e a lista de empresas em que estou a pensar investir. Hoje, a resiliência é a prioridade máxima. Não temos forma de saber como o vírus se vai comportar e existem inúmeros imponderáveis. Quantas empresas e consumidores dependem de estímulos? O que acontecerá quando a estação da gripe começar? Teremos mais confinamentos e restrições? Quanto tempo teremos que aguardar por uma vacina? Chegará alguma vez? Que novos patógenos podem surgir?

Como investidores, temos que olhar para além do vírus. Os lucros de um ano não importam assim tanto. Assim, não podemos ficar obcecados pelas preocupações do dia. Mas, como já disse anteriormente, temos que chegar ao longo prazo. E estou convencido que esta pandemia é mais do que apenas uma preocupação do dia. Para além do risco de patógenos futuros, acredito que a atual pandemia é como um grande terremoto no ambiente de negócios, uma mudança permanente no ambiente, que causará estragos nalguns modelos de negócios incapazes de se adaptar e apressará a sua morte.

Mas para outros, a pandemia é uma oportunidade. Recentemente, assisti a uma apresentação virtual de uma empresa cuja administração destacou os pontos fracos de alguns concorrentes e como tinham conquistado cota de mercado desses concorrentes – e provavelmente conquistarão mais no futuro. Cotas de mercado que, antes da pandemia, se mantinham estáveis, ​​podem, nestas circunstâncias, alterar-se com relativa rapidez.

Em qualquer caso, quero ter um portfólio de negócios que possam prosperar numa variedade de ambientes. Quero apostar nas equipas que vão ganhar cota e não perdê-la. Quero que as minhas empresas sejam capazes de jogar ao ataque durante tempos difíceis como este.

Esta orientação exigiu que eu repensasse algumas posições e utilizei este rally para me livrar de empresas menos resilientes. O mundo mudou. Nós temos que evoluir ou… já sabemos a resposta.

Obrigado por ler este artigo.

Publicado em 14 de agosto de 2020


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