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Autoria
Bob Seawright
Bob Seawright

Publicado originalmente no blog A Better Letter a 20 de janeiro de 2023

Manter a Perspetiva

Diz a lenda que certa vez um jovem ambicioso se encontrou na presença do lendário magnata J. Pierpont Morgan. O jovem aventurou-se a indagar a opinião de Morgan quanto ao comportamento futuro do mercado de ações. A alegada resposta tornou-se um clássico:

“Jovem, creio que o mercado vai oscilar.”

Obviamente, ninguém se queixa quando os mercados oscilam para cima. São só as oscilações descendentes que trazem sofrimento.

Os mercados “oscilaram” em 2022. Manter este desempenho em perspetiva é o tema deste artigo.

2022 foi péssimo, pelo menos do ponto de vista do mercado.

A primeira sessão dos mercados de 2022 foi a 3 de janeiro e, logo ali, o S&P 500 atingiu outro máximo histórico, após 70 recordes em 2021. Na altura, era apenas mais um dia normal num rali que começou logo após a eleição de Barack Obama para presidente e continuou, na maior parte do tempo, inabalável, durante mais de uma década.

No fim de contas, aquela segunda-feira, dia de abertura de 2022, foi um ponto de viragem. O S&P 500 tinha subido mais de 600% desde março de 2009. Durante esse período, os investidores foram generosamente recompensados por investir em ações.

Não mais.

O primeiro dia de negociação em 2022 foi o melhor dia de 2022. As ações não regressaram ainda a este nível. Foi o máximo do ano no S&P. Foi o máximo do ano no NASDAQ.

Dois dias depois, a 5 de janeiro, a Reserva Federal divulgou as atas da reunião anterior, que revelou que os banqueiros centrais estavam tão preocupados com a inflação que ponderavam acelerar o ritmo de subida das taxas de juro.

Os mercados receberam mal a notícia e o recuo subsequente foi o precursor do resto do ano. Foi sempre a descer a partir desse ponto. A reação atingiu todos, em todo o lado, ao mesmo tempo. E esta não foi a única má notícia.

A primeira grande guerra na Europa desde os anos 90, sanções sem precedentes, caos no preço da energia, cadeias de fornecimento emaranhadas, mais um ano de Covid, resgates, taxas de juros globais a subir ao ritmo mais rápido em quatro décadas, o pior mercado de obrigações de todos os tempos, uma economia chinesa vacilante, um economia americana superaquecida, os mercados imobiliários efervescentes em todo o mundo rico e uma explosão nas cripto, tudo contribuiu para um péssimo ano no mercado de ações.

Mais importante, talvez, os últimos 12 meses marcaram uma mudança geracional para os mercados financeiros, já que o Fed subiu repetidamente as taxas de juros para tentar conter a inflação mais elevada das últimas quatro décadas. Os esforços do Fed parecem estar a funcionar, embora não tão rapidamente ou acertadamente como o desejado. No entanto, as ações agressivas do Fed para desacelerar a economia dos EUA, a maior do mundo, não deixaram de ter consequências em toda a parte.

 

A carteira padrão 60:40 (60% S&P 500: 40% Bilhetes do Tesouro a 10 anos),  a principal referência para investidores individuais desde há muito tempo, caiu 17,5% em 2022, já que ambos os componentes sofreram enormes recuos.

Após três anos de ganhos consecutivos, em 2022 o S&P 500 perdeu 18,11% – apesar de um ganho de 7,56% no 4º trimestre. De acordo com a Morningstar, o fundo de ações médio dos EUA terminou 2022 com uma queda de aproximadamente 17%, o fundo médio de valor caiu cerca de 6% e os fundos de crescimento caíram em média quase 30%.

As ações estrangeiras não foram imunes às consequências macroeconómicas causadas pelas dificuldades nos mercados americanos.

Custos de crédito mais altos significam lucros menores para as empresas. Espera-se que os lucros das empresas do S&P 500 tenham crescido 5,1% em 2022, bem abaixo do aumento médio anual de 8,5% dos últimos 10 anos, de acordo com o FactSet. Excluindo a energia, os lucros do S&P 500 teriam caído 1,8% este ano.

Lucros médios a miseráveis fizeram com que as ações caíssem acentuadamente ao longo do ano. Os mercados globais de ações perderam 33 triliões de dólares de capitalização desde os máximos. Este problema atingiu especialmente as empresas de tecnologia, cujo enorme crescimento foi em grande parte alimentado por taxas de juros baixíssimas.

Mais especificamente, as ações das “big tech” tiveram um péssimo ano em 2022. Por exemplo, a Tesla caiu 65%, o pior desempenho anual desde que a empresa começou a cotar em 2010 e este foi apenas o segundo ano em que as ações se desvalorizaram. O CEO da Tesla, Elon Musk, perdeu mais de 200 biliões de dólares em património líquido. Talvez ainda pior, Musk comprou o Twitter.

À medida que os investidores perdiam dinheiro no mercado de ações e as famílias enfrentavam os custos crescentes da inflação, outros mercados mais especulativos também perdiam gás. Alguns absurdos flagrantes proclamavam que algo estava mal. Um iate virtual foi vendido no metaverso de um jogo online por 650.000 dólares, transações imobiliárias virtuais no metaverso totalizaram mais de 500 milhões de dólares e uma bolsa Gucci digital foi vendida no metaverso por 4.000 dólares, mais do que uma real.

Isto não poderia durar... e não durou.

O preço da Bitcoin, a criptomoeda mais conhecida, caiu 65%, e as chamadas meme stocks como a GameStop (-50%) e a AMC Entertainment (-85%) caíram ao longo do ano.

Ainda assim, a economia dos EUA permaneceu resiliente, especialmente em comparação com o resto do mundo. A Europa enfrentava uma crise energética. A China vacilou (-23%) por entre confinamentos relacionados com o Covid-19. A força relativa dos Estados Unidos tornou-o um lugar mais seguro para os investidores globais investirem o seu dinheiro, e o influxo de dinheiro ajudou a fazer subir o dólar. Em 2022, pela primeira vez em 20 anos, o dólar valia mais que o euro.

Um relatório inesperadamente negativo que mostrava um colapso no sentimento do consumidor poucos dias antes de uma reunião do banco central ajudou a enviar o S&P 500 para um bear market, definido como uma queda de pelo menos 20% em relação ao máximo anterior – neste caso, 3 de janeiro de 2022.

O Fed já tinha subido as taxas de juros duas vezes, num total de 0,75 pontos percentuais – tanto quanto o banco central tinha previsto ser necessário para todo o ano – e preparava-se para outra subida de taxa, que se esperava ser de 0,5 pontos percentuais. Em vez disso, o Fed subiu 0,75 pontos percentual, pela primeira vez em quase três décadas, sinalizando os riscos atribuídos ao aumento da inflação.

Mesmo assim, este eventos turbulentos levaram alguns traders a pensar que o pior já tinha passado. Em julho, quando as apresentações de lucros das empresas do segundo trimestre começaram a ser melhores que o esperado, o mercado de ações recuperou. De meados de junho a meados de agosto, o S&P 500 subiu 17,4%.

Este rali não foi sustentável.

 

O presidente do Fed, Jerome Powell, alertou os investidores em agosto de que o combate contra a inflação estava longe de terminar e que as taxas de juros teriam de subir consideravelmente mais. Os mercados de ações entenderam a mensagem e o S&P 500 atingiu novo mínimo em outubro.

Ainda assim, quando a inflação começou a moderar, as ações recuperaram dos mínimos. O S&P subiu 7,56% desde outubro até ao final do ano.

2022 encerrou um período de 40 anos de taxas de juros cada vez mais baixas que tornaram os empréstimos baratos e encorajaram o risco – nas ações, nos mercados de dívida, nos imóveis e até mesmo em criptomoedas – na procura de retornos lucrativos. TINA (“Não há alternativa”) está morta.

Em 2022, o S&P 500 teve o seu pior desempenho anual desde 2008. As ações tecnológicas foram especialmente atingidas. O crédito já não é barato. As obrigações foram massacradas. Gigantes de criptomoedas como a FTX entraram em colapso.

Resumindo: 2022 foi um péssimo ano para os mercados. Pelo menos a energia funcionou bem.

No entanto, é preciso introduzir aqui algum contexto. Ir do ponto A ao ponto B é quase sempre mais confuso do que esperamos. Quedas – como as que vimos em 2022 – são o custo de retornos muito mais elevados que as ações oferecem ao longo do tempo, em comparação com outras oportunidades de investimento.

Há muito tempo, Sir Isaac Newton descobriu as Três Leis do movimento, que foram obra de um génio. Mas os talentos de Newton não se estendiam ao investimentos. Ele perdeu uma fortuna na Bolha dos Mares do Sul, e justificou-se mais tarde: “Consigo calcular o movimento das estrelas, mas não a loucura dos homens”. Se não tivesse ficado tão traumatizado com essa perda, Newton poderia muito bem ter descoberto a Quarta Lei, formulada por Warren Buffett.

“Para os investidores, os retornos diminuem à medida que a atividade aumenta.”

É por isto que, pelo menos até agora, investir valeu sempre a pena no longo prazo; 2022 foi feio, mas, no longo prazo, foi completamente normal.


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