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Autoria
Morgan Housel
Morgan Housel

Originalmente publicado no blog Collaborative Fund, por Morgan Housel.

Muitas tragédias da noite para o dia, nenhum milagre

"A história é o registo dos passos e deslizes do Homem. Mostra-nos que os passos foram lentos e ligeiros; os deslizes, rápidos e abundantes."
B.H. Hart

Uma coisa importante que explica muitas coisas é que as boas notícias levam tempo, mas as más notícias acontecem instantaneamente.

A 24 de setembro de 1955, Dwight Eisenhower comeu um hambúrguer ao jantar. Mais tarde, disse à esposa que as cebolas lhe estavam a causar azia. Então começou a entrar em pânico. O presidente teve um ataque cardíaco fulminante que poderia facilmente tê-lo matado. Se tivesse acontecido, Eisenhower ter-se-ia juntado a mais de 700.000 americanos que morreram de doenças cardíacas naquele ano.

O que aconteceu desde então foi extraordinário. Mas poucos prestaram atenção.

Segundo o National Institute of Health, a taxa de mortalidade per capita ajustada por idade causada por doenças cardíacas diminuiu mais de 70% desde 1950.

Tantos americanos morrem de doenças cardíacas que reduzir a taxa de mortalidade em 70% resulta num número de vidas salvas que é difícil de compreender.

Se esta taxa não tivesse diminuído nos últimos 65 anos - se não tivéssemos melhorado o tratamento de doenças cardíacas – teriam falecido mais 25 milhões de americanos nos últimos 65 anos do que realmente morreram.

25 milhões!

Mesmo num único ano, a melhoria é inacreditável: mais de meio milhão de americanos não morrem de doenças cardíacas a cada ano do que se não tivéssemos feito nenhuma melhoria desde os anos 50. Imagine a população de Atlanta salva a cada ano. Ou um estádio de futebol repleto salvo todos os meses.

Como é que esta não é uma história com maior impacto?

Por que é que não estamos a festejar nas ruas o quão incrível isto é e a levantar monumentos aos cardiologistas?

Vou explicar porquê: porque a melhoria aconteceu lentamente demais para que alguém se apercebesse.

Esta é a evolução anual na mortalidade causada por doenças cardíacas:

A queda média é de 1,5% ao ano.

Como reagiríamos se víssemos uma manchete que dizia: “Mortes causadas por doenças cardíacas caem 1,5% no ano passado”? Bocejaríamos e seguiríamos em frente. E foi isso que fizemos.

Fazemos isto a toda a hora. As coisas mais importantes vêm da taxa de composição. Mas a taxa de composição demora muito e, por isso, é fácil de ignorar.

As novas tecnologias demoram anos ou décadas até que as pessoas se apercebam e mais anos ou décadas até que as pessoas as aceitem e as coloquem em uso. Mostrem-me uma nova tecnologia que foi imediatamente reconhecida pelo seu potencial e imediatamente adotada pelas massas. Não existe. Muito do pessimismo é alimentado pelo fato de que, muitas vezes, parece que não inovamos há décadas, exatamente porque leva décadas para repararmos nas inovações. Isto é verdade mesmo nas ciências exatas: o historiador David Wooton diz que levou 200 anos desde a descoberta de germes até que a comunidade médica aceitasse que os germes causam doenças.

O mesmo para o crescimento económico. O PIB per capita real aumentou oito vezes nos últimos 100 anos. A América da década de 1920 tem o mesmo PIB real per capita que o Turquemenistão tem hoje. O nosso crescimento nos últimos 100 anos tem sido inacreditável. Mas é, em média, 2% ao ano, o que é fácil de ignorar num dado ano, década ou vida. Os americanos com mais de 50 anos viram o PIB real por pessoa pelo menos dobrar desde que nasceram. Mas as pessoas não se lembram da época em que nasceram. Lembram-se dos últimos meses, quando o progresso é sempre invisível.

O mesmo vale para os investimentos. As ações da Netflix subiram 35 000% entre 2002 e 2018. Mas, em 94% dos dias, o preço estava abaixo do máximo histórico anterior, o que tornou o progresso fácil de ignorar e o número de investidores que mantiveram a Netflix em carteira de de 2002 a 2018 perto do zero.

O mesmo vale para as carreiras, o progresso social, marcas, empresas e relacionamentos. As boas notícias demoram sempre muito tempo, às vezes até tempo demais para percebermos o que aconteceu.

Mas as más notícias? 

As más notícias não são tímidas nem subtis. Chegam instantaneamente, tão rapidamente que sobrecarregam a nossa atenção e não conseguimos desviar o olhar.

Pearl Harbor e 11 de setembro são provavelmente os dois maiores eventos noticiosos dos últimos 100 anos. Ambos duraram menos de duas horas, do início ao fim.

Em menos de 30 dias, a maioria das pessoas passou de nunca terem ouvido falar do Covid-19 e verem as suas vidas irreversivelmente mudadas.

Em menos de 15 meses, a Lehman Brothers – um banco com mais de 158 anos - passou de um máximo histórico à falência. O mesmo aconteceu com a Enron, Fannie Mae e Freddie Mac, Nokia, Bernie Madoff, Muammar Gaddafi, Notre Dame e a União Soviética. Coisas que prosperaram durante décadas podem ser arruinadas em minutos. Não existe um equivalente na direção oposta.

Há uma boa razão para isso.

O crescimento é obrigado a combater a concorrência que tenta retardar a sua ascensão. As novas ideias lutam por atenção, os novos modelos de negócios lutam contra os agentes instalados, construir um prédio luta contra a gravidade. Há sempre ventos contrários. Pelo contrário, todos se afastam do caminho do declínio. Os insiders bem tentam impedi-lo, mas não atrai massas de estranhos que correm para o tentar empurrar na direção oposta, como o progresso faz.

A ironia é que o crescimento e o progresso são muito mais poderosos do que o retrocesso. Mas o revés recebe sempre mais atenção por causa da rapidez com que ocorre. Portanto, o progresso lento, no meio de uma tempestade de más notícias, é o estado normal das coisas. Não é algo a que seja fácil habituarmo-nos, mas é algo que estará sempre connosco.


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