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Autoria
Barry Ritholtz
Barry Ritholtz

Artigo da autoria de Barry Ritholtz, originalmente publicado no seu blog The Big Picture em 6 de maio de 2020.

O que os modelos não sabem

A economia está congelada por causa do coronavírus. Provavelmente não poderá ser completamente reaberta até que tenhamos testes e rastreamento adequados, uma vacina ou tratamento eficaz ou imunidade para toda a população, e é possível que nada disto venha a acontecer. O número total esperado de infeções e mortes neste ano e no próximo é apenas um palpite. Os epidemiologistas modelaram várias probabilidades, com um vasto intervalo de desfechos possíveis.

No entanto, depositámos muita fé nesses modelos e em muitos outros, porque grande parte de nossas vidas é guiada por eles. Não vivemos numa realidade objetiva; na verdade, funcionamos num modelo que nós próprios construímos. Os nossos cérebros criam esboços mentais, preenchendo-os continuamente com informação ausente de maneira a formar uma imagem que podemos discernir e identificar. Esta é uma característica evolucionária útil que nos permitiu sobreviver num mundo hostil para nós, criaturas macias e deliciosas, sem garras, presas ou armadura.

Então, por que motivo é isto um problema? Simplesmente porque não reconhecemos que os modelos, segundo o jornalista Jonathan V. Last, "não são um relatório enviado do futuro". Os modelos são construídos com "coisas que conhecemos, coisas que achamos que conhecemos e coisas de que não fazemos ideia". Há muitas coisas que nós achamos que sabemos sobre o Covid-19 e provavelmente ainda mais coisas que não sabemos e é por isso que os modelos do coronavírus oferecem um intervalo de possíveis desfechos tão amplo, em termos de mortalidade.

A ressalva padrão do estatístico George E. P. Box é que "todos os modelos estão errados, mas alguns são úteis". Os modelos matemáticos podem ajudar-nos a compreender o mundo, desde que as nossas suposições sejam válidas e não lhes forneçamos maus dados. Box recorda que a matemática cria uma sombra da realidade e que o universo é muito mais complexo do que qualquer um dos nossos modelos sugere.

Mais precisamente, todos os modelos são defeituosos porque a premissa subjacente a todos eles é que o futuro será semelhante ao passado. Nada distorce mais um modelo do que "coisas sobre as quais não fazemos ideia" destroem a premissa fundamental.

Em muitos casos, os erros que os modelos produzem não são importantes. A Netflix construiu um excelente negócio ao modelar as nossas preferências com base nos nossos hábitos de visualização relativamente ao que os restantes 167 milhões de assinantes gostam. Se os algoritmos errarem, a única perda é que a Netflix nos sugere um filme que acabamos por não gostar.

Isto torna-se muito mais caro e perigoso quando nos esquecemos que estes modelos são representações imperfeitas da realidade. Em 2008, os economistas, com todas as suas elaboradas construções matemáticas, não conseguiram antecipar a crise financeira. Nenhum dos seus modelos previa o aumento dos créditos à habitação que não exigiam coisas básicas como historial de crédito, emprego e rácios básicos de empréstimo / valor. O papel das securitizações subprime no encher da bolha do mercado imobiliário para além do que os rendimentos eram capazes de sustentar também nunca foi incluído nos modelos.

 

A nossa fé nos modelos financeiros já deveria ter sido temperada pelo colapso, dez anos antes, do fundo Long-Capital Capital Management, cujos complexos modelos criados por dois galardoados com o Nobel nunca previram que a Rússia alguma vez não pagaria as suas dívidas.

Que eventos nunca aconteceram antes e estão a acontecer agora?

  • O movimento em direção a taxas de juro negativas nos EUA está a destruir o modelo de inflação e yield da Reserva Federal. Como diz o velho ditado, se o Fed não consegue modelar algo, assume que não existe.
  • O Bureau of Labor Statistics nunca teve que lidar antes com 20% da força de trabalho a solicitar subsídio de desemprego num mê Isto não estava, com certeza, em nenhum dos cálculos.
  • O investimento em valor, o modelo defendido por Benjamin Graham e Warren Buffett, está com dificuldades porque não antecipou inflação reduzida, baixas taxas de juros e enormes intervenções no mercado por parte do Fed.
  • O modelo de especulação e cobertura de petróleo foi devastado. No mês passado, com dois dos maiores produtores mundiais em guerra de preços, um colapso na procura devido à pandemia e a falta de espaço para armazenamento de petróleo, os preços dos futuros negociaram a 40 dólares negativos por barril - o que significa que os detentores de petróleo tiveram que pagar para lho tirarem das mã

Mantenhamos em mente que, em termos de pandemia, não estamos a falar de um “cisne negro”, termo popularizado por Nassim Taleb - que, a propósito, não acredita que o Covid-19 se possa classificar como um “evento imprevisível, raro e catastrófico”. Em 2015, Bill Gates previu que algo semelhante poderia vir a acontecer. Assim como todas as equipas de preparação anti- pandemia, incluindo algumas que a administração Trump dissolveu ou reduziu. Esta decisão foi tomada para poupar alguns dólares, apostando que o risco nunca se materializaria.

Por isso, os modelos nem sequer eram necessários para nos ajudar a ver a catástrofe do coronavírus; bastava algum senso comum.


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