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A gestão de fortunas moderna assemelha-se, infelizmente, a uma profissão muito antiga, a alquimia, com as suas constantes promessas de transformar chumbo em ouro, tal como os gestores de dinheiro que repetidamente prometem transformar retornos baixos em retornos altos e garantidos. Isto levanta a questão: porque continuam os investidores a acreditar nas histórias que os gestores/alquimistas contam?

I - A TRISTE HISTÓRIA DE SIR ROGER TICHBORNE

Podemos aprender algo sobre a razão pela qual as pessoas caem constantemente nestas armadilhas analisando a triste história de Roger Tichborne. Tal como muitos outros jovens vitorianos, Sir Roger partiu em 1854 à aventura para a América do Sul. No Brasil, embarcou no navio Bella. Quatro dias mais tarde, os destroços do Bella deram à costa e todas as almas dadas como perdidas. Lady Tichborne, mãe de Sir Roger, recusou-se a acreditar que o seu filho falecera. Encorajada por um médium que insistia em dizer-lhe que ela não encontraria o seu filho no além, Lady Tichborne publicou diversos anúncios nos jornais oferecendo uma recompensa por qualquer informação sobre o seu filho. Cerca de dez anos após o desaparecimento de Sir Roger, Lady Tichborne foi contactada por um solicitador australiano que a informou que o seu filho estava vivo, bem de saúde, e trabalhava como talhante em Wagga Wagga. Lady Tichborne, felicíssima, enviou fundos para que o filho fosse repatriado. Aquando da sua chegada, Lady Tichborne reconheceu o homem como sendo o seu filho e estabeleceu um estipêndio anual de £1000.

Nem todos ficaram totalmente convencidos que o "candidato" a filho recém-chegado fosse, de facto, Sir Roger. É perfeitamente possível que o peso de uma pessoa se altere ao longo dos anos. Contudo, Sir Roger era fluente em grego e latim, o "candidato" não. Sir Roger tinha conhecimentos práticos de química, o recém-chegado não conseguia distinguir cloreto de sódio de carbonato de cálcio. É possível esquecer coisas aprendidas há muitos anos; talvez uma pancada na cabeça durante o naufrágio do Bella tenha resultado numa perda de memória. No entanto, é muito raro que tatuagens desapareçam espontaneamente, mesmo no sol escaldante da Austrália. Sir Roger tinha algumas, o recém-chegado não exibia nenhuma. Mais raro ainda é o fenómeno de mudança de cor dos olhos. Sir Roger tinha os olhos azuis, o candidato tinha-os castanhos.

Lady Tichborne, de alguma forma, conseguiu ignorar todas estas evidências. Só depois da sua morte é que a família conseguiu finalmente desmascarar o impostor australiano que acabou por passar dez anos na prisão por perjúrio.

A moral desta história? Nunca subestime a vontade das pessoas acreditarem na história mais fantástica, desde que ela encaixe nas suas ideias preconcebidas.

II - RETORNOS DO FUNDO MISTÉRIO VERSUS RETORNOS S&P 500

Os investidores estão constantemente em busca do Santo Graal do investimento, uma estratégia que gera bons retornos e não tem recuos de monta - algo parecido com o Fundo Mistério, retratado na imagem. Costumamos dizer que os investidores se comportam como Lady Tichborne e, nos seus anúncios revelam os seus desejos: retornos constantes e suaves, mas sempre crescentes, estar completamente investidos quando o mercado começa a subir e completamente desinvestidos quando os mercados recuam. Os gestores de dinheiro alegremente criam essas ilusões e ideias preconcebidas.

Infelizmente, o gráfico representa os retornos de um tal Bernie Madoff (investidor que operava um esquema de pirâmide e cometeu a maior fraude financeira na história dos EUA). A lição óbvia do caso Madoff é que se alguma coisa parece boa demais para ser verdade, provavelmente é. No entanto, tal como Lady Tichborne, os investidores veem aquilo em que querem acreditar.

III - MOSTRA-ME O QUE QUERO VER

Karl Popper argumentava que a única forma de testar uma hipótese era procurar as evidências que provassem que a hipótese estaria errada. Charles Darwin também procurava provas que contradissessem a sua teoria. De cada vez que encontrava um facto que parecia contradizer a sua teoria da evolução, anotava-o e tentava compreendê-lo. Esta não é, no entanto, a forma como habitualmente os seres humanos funcionam. Esta não é a forma como nos comportamos como investidores: formamos as nossas convicções e depois passamos o tempo a procurar a informação que confirma o nosso ponto de vista.

Temos o hábito de procurar apenas a informação e pontos de vista que concordam connosco: faz-nos sentir confortáveis, gostamos de ouvir quem concorda connosco e de ouvir as nossas próprias opiniões refletidas nos outros.

Existe ainda um problema adicional e que agrava este viés: quando confrontados com opiniões contrárias, temos a tendência em considerar a fonte de informação como enviesada.

IV - PRISIONEIROS DOS NOSSOS PRECONCEITOS

Embora a história da Lady Tichborne seja um caso extremo de cegueira face às evidências, encontramos com frequência casos menores. Por exemplo, a um grupo de pessoas foi pedido que lessem um conjunto, aleatoriamente selecionado, de estudos sobre a eficácia dissuasora da pena de morte (e estudos que criticavam essa eficácia). A esse grupo foi pedido também que classificassem os estudos em termos do impacto que tiveram nas suas próprias convicções sobre a pena de morte. Metade das pessoas eram a favor da pena de morte e os restantes eram contra.

Aqueles que eram já a favor da pena de morte concluíram que os estudos que apoiavam a pena de morte apresentavam bons argumentos. Concluíram também que os estudos que apresentavam argumentos contra a pena de morte tinham falhas profundas. As pessoas que tinham a posição oposta no início chegaram à conclusão exactamente oposta. Na realidade, os pontos de vista de cada participante polarizaram-se, tornando-se mais extremos do que no início da experiência.

V - A INOVAÇÃO FINANCEIRA

De tempos a tempos, a indústria financeira reclama os benefícios da inovação de produtos novos. A inovação deveria significar prosperidade, algo de excitante. Infelizmente, partilho a visão de J. K. Galbraith e Paul Volcker no que diz respeito à indústria financeira. Galbraith dizia "O mundo das finanças saúda a invenção da roda uma e outra vez, frequentemente numa versão ligeiramente mais instável." Paul Volcker, antigo secretário do tesouro americano, declarou que a única inovação financeira útil dos últimos 30 anos foi o Multibanco.

Uma das modas mais populares nos círculos do investimento atualmente é que os investidores devem ser inventivos na sua exposição ao Beta. As inovações nesta área tem uma variedade de nomes, tais como, smart beta, fatores de risco, etc. No investimento em ações testemunhámos o nascimento de várias estratégias: variância mínima, baixa volatilidade, índices fundamentais ponderados e outros. Grande parte dos “especialistas”, que repetem vezes sem conta estas palavras, não sabem o seu significado e muito menos os riscos que estes produtos têm associados.

Estes nomes, siglas e frases, são o resultado do marketing da indústria financeira: palavras como premier, triunfo, premium, Valor Mais, Segurança Ativa, umas quantas palavras em inglês para parecer inteligente, sofisticado e seguro. Conseguem criar a ilusão aos investidores de segurança, qualidade, exclusividade, inteligência e bons retornos.

Na passada segunda-feira, um estudo da PROTESTE INVESTE, publicado pelo Jornal de Negócios, apresenta dados arrasadores sobre produtos financeiros complexos comercializados pela banca. Desde rendimento nulo em 70% destes produtos, à criação da ilusão por parte das instituições bancárias, são apresentados argumentos suficientes para que este tipo de investimento não seja considerado pelos investidores.

V - “MATAR” A EMPRESA

O que podemos fazer então para defender os nossos investimentos desta tendência insidiosa de procurar apenas informação que concorde connosco? A resposta óbvia é que precisamos de aprender a procurar informação que prove que a nossa análise está errada.

No entanto, tal como acontece com a maioria dos vieses comportamentais que tanto nos condicionam como investidores, embora a resposta seja relativamente óbvia, a implementação da solução é muito mais difícil.

Bruce Berkowitz, famoso investidor em valor, destaca-se no esforço que dedica na tentativa de se proteger dos perigos do viés confirmatório: em vez de procurar a informação que defenda um investimento, Berkowitz tenta “matar” a empresa: “analisamos as empresas, contamos o dinheiro e tentamos matar a empresa. Tentamos imaginar o que poderá correr mal com a empresa – uma recessão, taxas de juro exageradas, um ataque terrorista, etc. Tentamos matar as nossas ideias de todas as maneiras possíveis. Se não o conseguirmos, talvez tenhamos uma boa oportunidade de investimento. Se investirmos em empresas preparadas para tempos difíceis, especialmente se tiverem gestores adequados, quase que desejamos que esses tempos difíceis surjam porque é nessa altura que se conseguem comprar os melhores negócios”.

Os investidores podem aprender muito com Berkowitz: ao concentrar-se naquilo que pode correr mal, está a proteger-se e só será surpreendido pelos lucros – o que nunca é mau – e não pelas perdas.

Para os Investidores em Valor, a regra de ouro do investimento é que nenhum ativo é tão bom que possa ser comprado qualquer que seja o seu preço. A segurança com que investimos e os retornos do investimento, são o resultado da nossa disciplina e paciência em aplicar essa regra de ouro.

Infelizmente, não é isto que a esmagadora maioria dos investidores querem ouvir. Repetem vezes sem conta o mesmo erro. É evidente que o barbeiro lhes vai dizer que precisam dum corte de cabelo.

Esclareça as suas questões comerciais com um representante da Casa de Investimentos.

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