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Autoria
Lauren Foster
Lauren Foster

Em artigo publicado originalmente no blog do CFA Institute, Lauren Foster analisa a intervenção de Aswath Damodaran na "CFA Institute Equity Research and Valuation 2019 Conference". 

O Dilema da Disrupção: Histórias e Números

Existe um ditado, frequentemente confundido com uma maldição chinesa; “Que possas viver em tempos interessantes”.

Aswath Damodaran moderniza-o para descrever a nossa era atual: “Vivemos em tempos disruptivos”.

A disrupção está em todo o lado. Jovens rivais estão constantemente a desafiar o status quo, quer seja uma empresa que descobriu uma nova forma de cultivar comida em pavilhões, desenvolver diamantes num laboratório ou fotografar a Terra.

“Num determinado sentido, podemos dividir o mundo em disruptores e “disrompidos””, declarou Damodaran perante a audiência da

CFA Institute Equity Research and Valuation 2019 Conference. “Não importa qual o negócio em que se encontra, ou está a ser disrompido e, nesse caso, sente-se deprimido ou é um disruptor, e está a sentir-se mais otimista – mas está a queimar dinheiro a um ritmo alucinante”. 

Embora seja mais difícil avaliar disruptores, o ponto positivo é que temos a oportunidade de brilhar quando avaliamos empresas jovens. Exceto numa questão: a disrupção é desconfortável. Profundamente desconfortável.

Fique à vontade com o desconforto

Porque temos tão pouco à vontade com a disrupção? Porque ela traz a coisa que mais tememos: incerteza. “Nós, seres humanos”, diz Damodaran, “não gostamos de lidar com a incerteza”. E respondemos à incerteza da forma com sempre o fizemos:

  • Procurando a influência divina: “Rezar pela intervenção de um poder superior é o sistema de gestão de risco mais antigo e mais praticado de todos”, diz Damodaran.
  • Com inércia e negação: “Quando confrontados com a incerteza, alguns de nós ficam paralisados”, declara. “Junto com a paralisia, está a esperança de que, se fecharmos os olhos, a incerteza desaparecerá”.
  • Com heurísticas: “Os economistas comportamentais notam que os investidores, face à incerteza, adotam atalhos mentais que não têm qualquer fundamento na realidade”, explica Damodaran.
  • Juntando-se ao rebanho: “quando em dúvida”, diz Damodaran, “é mais seguro deixarmo-nos ir com a multidão”.
  • Outsourcing: “Assumir que existem especialistas e peritos que têm todas as respostas tira-nos o peso dos ombros”, explica Damodaram, “mesmo que eles não façam ideia do que estão a falar”.

Mas, para os profissionais do investimento que, por definição, estão muito mais “comprometidos” com os números, o dilema da disrupção é mais profundo.

“Acredito que, no fundo, o que nos torna desconfortáveis com a disrupção é a incerteza que traz a cada número que medimos”, conclui Damodaran.

Que tipo de incerteza?

Segundo Damodaran, a incerteza pode tomar diversas formas: incerteza nas estimativas versus incerteza económica, incerteza micro versus macro e contínua versus discreta. E, dependendo da forma, a incerteza pode ser mitigada, até certo ponto.

Mas a incerteza também evolui à medida que as empresas amadurecem e atravessam os respetivos ciclos de vida. Assim, por exemplo, na fase start-up, a incerteza pode ser sobre se a ideia tem ou não potencial. 

À medida que a empresa avança para a fase de crescimento jovem, a incerteza poderá ser sobre se existe um modelo de negócio com o qual comercializar a ideia. 

Para uma empresa na fase de crescimento rápido, poderá ter a ver com se o modelo de negócio será capaz de gerar crescimento. Mais tarde, quando a empresa está em declínio (a fase final), a incerteza terá a ver com se a gestão da empresa terá capacidade de reconhecer a realidade. 

O ciclo de vida de uma empresa, segundo Damodaran, é como o de uma pessoa. “Start-ups são como bebés. A diferença é que as start-ups têm uma taxa de mortalidade muito mais elevada. Dois terços de todas as start-ups não resistem”.

Depois chegam os desastrosos dois. “se ultrapassar a fase de start-up, a empresa é agora uma criança. O que fazem as crianças? Vão contra as coisas, caem a toda a hora. E as empresas, na fase de criança, terão anos bons, anos maus, vão quase conseguir, quase rebentar, quase ter sucesso. 

Ultrapassa os anos de criança e torna-se adolescente. O que fazem os adolescentes?  Acordam todos os dias e perguntam, “o que posso fazer hoje para rebentar tudo?” 

A Tesla, diz Damodaran, uma empresa de que é acionista, é a sua adolescente empresarial. “Tem enorme potencial, mas todas as manhãs, Elon Musk acorda e questiona-se, o que posso fazer hoje para rebentar tudo? 

Obviamente, assim que os anos da adolescência passam, a empresa aproxima-se do seu potencial pleno. 

“Estás no pico da vida”, diz Damodaran, “pensem no Facebook ou Google de há dois anos. Tudo o que tocas se transforma em ouro. Goza o momento, porque após o pico da tua vida, resta a meia idade. 

Na meia idade, a vida não é tão excitante. Mas goza este momento também porque, depois da meia idade, restam os dias negros, quando envelhecemos e morremos”.

O que tem isto a ver com a disrupção?

“A incerteza é maior quando nos encontramos na fase jovem”, diz Damodaran. “O tipo de incerteza que enfrentamos muda assim como a quantidade de incerteza. É por isso que nos sentimos mais confortáveis a avaliar empresas maduras e passamos tanto tempo no custo de capital”.

Mas o valor real está na avaliação de empresas jovens.

Confrontado com a escolha de avaliar a icónica marca de jeans, Levi Strauss, que entrou em bolsa em março de 2019, ou as Uber ou WeWorks do mundo, Damodaran é perentório:

“Conseguimos avaliar a Levi Strauss mais precisamente, mas também qualquer um o pode fazer. Porquê? Porque têm exatamente a mesma vantagem que nós”, explica Damodaran.

“enquanto que com a Uber ou WeWork, quando avaliamos a empresa, já somos especiais. Sabem porquê? Porque a maioria das pessoas desiste. A maior parte das pessoas apreçam a companhia. Dizem, “o que estão todos os outros a pagar?” Temos uma vantagem decisiva, porque realmente terminamos a avaliação”.

Conclusão de Damodaran: “A recompensa das avaliações é maior quando nos sentimos desconfortáveis, quando sentimos vontade de desistir”.

O lado negro da disrupção

Mas, por cada Tesla, existe uma Ford. Por cada Amazon, uma J.C. Penney. Existem vencedores e perdedores na equação da disrupção. Por cada disruptor que desafia o status quo com uma nova forma de fazer as coisas, há uma empresa disrompida.

Damodaran chama a isto a dança da disrupção, e acrescenta a sua versão do modelo de Kubler-Ross das cinco etapas do luto – as cinco etapas da disrupção:

1. Negação e ilusão

2. Falhanço e falsa esperança

3. Imitação e inércia institucional

4. Regulação, dobrar as regras e desafios legais

5. Aceitação e ajustamento

 

Narrativas e fé

Damodaran gosta de dizer que a disrupção é fácil, fazer dinheiro com ela é que é difícil. “Existe sempre o risco de, embora a disrupção possa ter sucesso, muitos disruptores, especialmente os primeiros, não beneficiam com ela”, explica. 

As narrativas são uma ferramenta essencial quando avaliamos disruptores, defende Damodaran. Na verdade, segundo ele, é “o maior segredo escondido da avaliação”.

“Uma boa avaliação é uma ponte entre histórias e números. A coisa mais perigosa que aconteceu à avaliação nos últimos quatro anos foi o Excel. Na maior parte das aulas de avaliação, tornámo-nos ninjas do Excel. Perdemos a capacidade de contar histórias com os números.”

Mas não apenas a capacidade de contar uma história que interessa. Temos que ter fé na nossa história.

“Não avalio empresas para viver. Não faço avaliações porque sou intelectualmente curioso. Não fico acordado à noite a pensar quanto vale o Facebook. Faço avaliações por uma única razão: quero agir com base nessas avaliações. E quero explicar-vos porque a fé as avaliações têm que andar de mão dada. Porque, para agir com base nelas, temos que ter fé, temos que acreditar nas nossas avaliações. Isto não tão fácil quanto parece. Podemos seguir todas as regras, mas, no fim de contas, é apenas um número. E depois precisamos de fé. Que tipo de fé precisamos? Que o preço se ajuste ao valor.” 

Damodaran esboça os cinco passos envolvidos no desenvolvimento de uma história de avaliação:

1. Desenvolver uma narrativa para o negócio que estamos a avaliar. Nesta narrativa, contamos a história de como vemos o negócio evoluir ao longo do tempo.

2. Testar a narrativa e para ver se é possível, plausível e provável. Existem inúmeras narrativas possíveis; nem todas são plausíveis e apenas algumas são prováveis.

3. Converter a narrativa em catalisadores de valor. Desmontamos a narrativa e tentamos trazê-la para critérios de avaliação desde tamanho do mercado potencial a cash flows e riscos. Quando terminarmos, cada parte da narrativa deve ter um lugar nos nossos números e cada número deverá ser suportado por uma porção da narrativa.

4. Ligar os catalisadores de valor a uma avaliação. Criamos um modelo de avaliação intrínseca que liga os dados introduzidos a um valor final para o negócio.

5. Manter este círculo de feedback aberto. Prestamos atenção às pessoas que conhecem o negócio melhor do que nós e utilizamos as suas sugestões para calibrar a nossa narrativa e até, talvez, alterá-la. Analisamos o efeito no valor de narrativas alternativas para a empresa. 

Atenção: as narrativas não são estáticas, por isso, devemos estar preparados para nos adaptarmos.

Damodaran conclui, “As histórias podem quebrar. As histórias podem mudar. Nunca me envergonhei de dizer que mudaria a história. E muitas vezes somos obrigados a fazê-lo. Jovens empresas, se ficarem “encalhados” na vossa história, estão em sarilhos.”


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