

Lições da Ascensão e Queda de um Génio do Mercado
Publicado originalmente por Safal Niveshak em julho de 2025 no site safalniveshak.com
Em 1929, pouco antes da Grande Depressão, Jesse Livermore era aclamado como uma lenda. Enquanto o resto de Wall Street se afogava em pânico, Livermore tinha aberto uma grande posição curta e ganhou mais de 100 milhões de dólares.
Os jornais chamavam-no "The Boy Plunger" (O Rapaz Especulador). Diz-se que a sua mulher tinha receio de dizer aos amigos quanto dinheiro tinham ganho. Parecia indecente.
Mas eis o “twist”. Menos de uma década depois, Livermore estava falido. E esta não foi a sua primeira falência. Nem seria a última.
Livermore fez e perdeu várias fortunas ao longo da sua vida. A sua história, que é parte genial e parte trágica, é capturada em Reminiscences of a Stock Operator, um relato ficcionado da sua vida escrito por Edwin Lefèvre. Embora a personagem principal se chame “Lawrence Livingston”, a narrativa espelha de perto a vida real de Livermore e a sua jornada pelos dos altos e baixos de Wall Street no início do século XX.
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Não se deixe enganar pelo título do livro (“Stock Operator” – Operador de Bolsa). A sabedoria que nos oferece é intemporal. Não sou um trader, mas estou convicto de que todos os investidores sérios deviam ler este livro. Este livro ensina-nos todas as formas de perder dinheiro nos mercados, e isso, acredito, é uma lição maior do que a de como fazer dinheiro.
A vida de Livermore pode parecer distante, mas os padrões emocionais que ele observou continuam atuais. Os mercados mudaram. A natureza humana, não. Então, o que podemos nós, como investidores modernos, aprender com um homem que surfou as ondas de Wall Street há cem anos? Muito.
O que se segue são algumas das lições de investimento mais profundas que aprendi com o livro. Estas são lições que podem (com sorte) poupar-nos um pouco da dor que Livermore teve de suportar para as aprender.
Comecemos por aqui.
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1. Estar Quieto é uma Estratégia Ativa
“Nunca foi a pensar que ganhei muito dinheiro. Foi sempre o estar quieto. Compreenderam? Estar firmemente quieto!”
Uma das lições mais famosas e negligenciadas de Livermore é o poder de não fazer nada. A maioria dos investidores acredita que a sua vantagem reside em fazer mais. Mas Livermore aprendeu da forma mais difícil que o segredo não é identificar a oportunidade. Muitos conseguem fazê-lo. O segredo está em manter o rumo dos seus investimentos quando cada fibra do nosso ser quer fazer alguma coisa.
Todos sabemos que os mercados são ruidosos. Mas raramente notamos que as nossas mentes o são ainda mais. Quando os preços das ações flutuam e a dúvida se instala, a tentação de agir, ou de fazer algo, torna-se esmagadora.
Mas Livermore lembra-nos, através das suas experiências e erros, que o dinheiro é feito não no movimento, mas na convicção.
Esta é uma verdade dura para os investidores modernos que estão constantemente a atualizar aplicações e a consumir notícias de hora a hora. O paradoxo é que, num mundo que se move mais rápido do que nunca, a nossa maior vantagem pode ser a capacidade de abrandar… e ficar quieto.
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2. Dicas São Tóxicas, Mesmo Quando Funcionam
“Dicas! Como as pessoas desejam dicas! Anseiam, não só por recebê-las, mas por dá-las. Há ganância envolvida e vaidade. É muito divertido, por vezes, ver pessoas realmente inteligentes a procurá-las. E o dador de dicas nem precisa de hesitar sobre a qualidade, pois o procurador de dicas não está realmente à procura de boas dicas, mas de qualquer dica. Se der resultado, ótimo! Se não, boa sorte para a próxima.”
Dicas são apenas isso. Dicas. Segui-las cegamente é a receita para uma ruína épica. Em primeiro lugar, não temos ideia da posição em que a pessoa que dá a dica se encontra. Ele pode nem sequer estar investido na ação que está a recomendar. Mesmo que esteja, não fazemos ideia de quando ele a vai despachar. Suponha que ele está a vender-nos a ação a nós. Então seríamos forçados a despejá-la a outra pessoa por um preço mais alto.”
Livermore tinha palavras duras para a cultura das dicas, e por boas razões. Ele viu inúmeros traders arruinarem-se a persegui-las.
Uma dica é como um atalho para evitar o trabalho árduo de pensar, de compreender e de assumir responsabilidade. Mas as dicas são perigosas, não apenas porque não são fiáveis, mas porque nos removem do lugar da tomada de decisões. Agimos com base na convicção de outra pessoa, ou pior, na manipulação de outra pessoa.
Ainda pior, a maioria das dicas não tem contexto. Não sabemos o horizonte temporal de quem dá a dica, a alocação de portfólio, a apetência pelo risco ou o motivo. Não sabemos se estão a comprar ou a vender. E mesmo que a dica acabe por estar correta, não sabemos por que razão funcionou, o que significa que não aprendemos nada.
O conselho de Livermore aqui é que devemos comprar ou vender apenas quando a nossa análise o leva a fazê-lo, e que devemos ser o dono de cada uma das nossas decisões.
Se precisamos de perguntar, "O que devemos comprar?", não estamos prontos para comprar nada.
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3. A Natureza Humana É a Única Constante do Mercado
“O jogo não muda e a natureza humana também não.”
Os mercados evoluíram desde os tempos de Livermore. Os instrumentos financeiros também se tornaram mais complexos. Mas a natureza humana, o software subjacente que impulsiona os mercados, manteve-se o mesmo.
A ganância, o medo, a inveja, a esperança, a excessiva confiança e o comportamento de rebanho não são falhas do sistema. Eles são o sistema. E Livermore, através de ciclos intermináveis de boom e bust, percebeu que o verdadeiro jogo não era prever os preços, mas antecipar as pessoas.
Mesmo que cada crash pareça novo e cada bolha pareça diferente, não o são. Livermore viu os mesmos comportamentos repetidos uma e outra vez, apenas com novos atores e figurinos.
A lição aqui é que se queremos ser melhores investidores, não nos podemos limitar a estudar os mercados. Temos de nos estudar a nós próprios e os outros. Devemos observar como as pessoas se comportam sob pressão, durante a euforia ou em negação. O investidor que compreende a psicologia tem uma vantagem que não desaparece com a tecnologia.
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4. Não Desperdicemos as Lições das Nossas Perdas
“Não há nada como perder tudo o que temos no mundo para aprendermos o que não devemos fazer.”
Livermore conheceu a perda intimamente. Faliu várias vezes. No entanto, para seu crédito, ele explorou os seus fracassos em busca de conhecimento. Acreditava que se aprende pouco com as vitórias, porque quando as coisas correm bem, assume-se que está tudo certo. São as perdas que forçam a introspeção. A dor é um professor realmente poderoso, mas só se estivermos dispostos a ouvi-lo.
Ele chegou a dizer:
“Estar falido é uma agência educativa muito eficiente.”
Mas o problema aqui é que a educação só é útil se for aplicada. Muitos traders e investidores perdem dinheiro, apenas para repetir os mesmos erros por negação ou ego.
O conselho de Livermore é claro: se perder, perca de forma consciente. Aprenda as lições. Mude a sua abordagem. E acima de tudo, não deixe que as suas perdas sejam desperdiçadas.
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5. Respeitemos o Mercado. Ele Não nos Deve Nada
Na noite de 28 de novembro de 1940, Livermore terminou a própria vida com um tiro.
Quando a polícia chegou, descobriu uma nota de suicídio. A nota era dirigida à sua esposa, Harriet, a quem ele carinhosamente chamava de "Nina". Nela, ele escreveu:
“Minha querida Nina: Não consigo evitar. As coisas têm corrido mal. Estou cansado de lutar. Não consigo continuar. Esta é a única saída. Não sou digno do teu amor. Sou um fracassado. Lamento muito, mas esta é a única saída. Com amor, Laurie.
A vida de Jesse Livermore deixou-nos, não apenas um legado de lições intemporais, mas também um alerta. Ele era brilhante e muito à frente do seu tempo na leitura de preços de ações e na compreensão da psicologia da multidão. Mas também usou demasiada alavancagem, negociou em excesso e subestimou as suas próprias fragilidades. Os seus anos finais foram marcados pelo desespero financeiro e pessoal, o que o levou a tirar a vida.
É importante lembrar isto... não para o julgar, mas para aprender. O mercado não se importa com o quão inteligente somos. Não nos deve nada. E se começarmos a acreditar que somos invencíveis, o mercado encontrará uma maneira de nos recordar do contrário.
Os anos finais de Livermore foram cheios de tumulto. E essa é a parte da história à qual devemos prestar atenção. Foi triste, mas foi real. Há uma linha ténue entre a confiança e a arrogância, e o mercado pune aqueles que a atravessam.
Então, o que é que realmente devemos concluir de tudo isto? Se tivesse de resumir, eu diria isto:
• Seja humilde,
• Seja paciente,
• Pense por si mesmo,
• Aceite que as perdas fazem parte do jogo, e
• Não deixe que o seu ego passe cheques que a sua carteira não consegue pagar.
Em última análise, os mercados não são apenas matemáticos, são psicológicos, emocionais e humanos. E quanto melhor compreendermos isto, melhor nos sairemos.
Não precisamos de comprar e vender como Livermore. Na verdade, provavelmente, não o devemos fazer. Mas devemos definitivamente aprender com ele. As suas vitórias e os seus erros são instrutivos. E as suas reflexões são intemporais. Leia-as lentamente. Deixe que se entranhem. E da próxima vez que o mercado testar a sua paciência ou a sua convicção, lembre-se das palavras de Livermore:
“Não há nada de novo em Wall Street. Não pode haver, porque a especulação é tão antiga quanto as colinas.”
Os jogadores mudam. As histórias evoluem. Mas o jogo, e as suas lições, permanecem os mesmos.